Manoel de Barros diz em um dos seus versos: “A criança erra na gramática, mas acerta na poesia”. Pensando nisso e, consequentemente, na vida, algo que me é muito peculiar, cheguei à conclusão de que a saída da vida é a poesia. É viver poeticamente. É ver a poesia, enxergar a poesia, é transver as coisas por meio da poesia, pois como diz o mesmo Manoel: “É preciso transver o mundo”. Com os olhos da infância, que sem preocupações sistematicamente racionais, se preocupam em descobrir o que há no mundo pronto para desabrochar.

Transver o mundo é transfigurar a realidade, é fugir das suas algemas, da sua limitação, do seu automatismo. Mas isso não implica fingir que ela não exista, e sim, encará-la de modo a modificá-la, acrescentando magia ao real, esmiuçando o óbvio, já que é quando esmiuçamos o óbvio que a magia presente na simplicidade das coisas vem à tona e, então, tem-se poesia. A poesia, dessa forma, está em tudo, nas maiores miudezas, basta que se olhe de forma enviesada, transversa. Viver poeticamente é buscar enxergar o óbvio, é não ser engolido pelos leões da normalidade, é sentir o vento na sombra.

Na maior parte do tempo sequer percebemos o que existe ao nosso redor. Somos seres de idas, mas a vida está nas encostas. A beleza do mundo requer um olhar periférico, oblíquo, insinuante, irreverente. Eu já acreditei que a saída estava no humor, mas entendi que o humor perpassa pelo poético, é um substrato da poesia, de modo que ao usar o humor, também somos poéticos, pois é condição própria da poesia dar voltas na razão e tornar a vê-la cheia de risos.

A poesia serve para isso: desconsertar. E nós estamos muito sérios. Precisamos ficar mais desconcertados, como quando olhamos para algo e o silêncio pinta na imaginação do olhar os versos que jamais conseguiríamos dizer com caneta e razão, porque certas coisas a gente só sente, não carece de explicação. Às vezes enxergar já é a melhor explicação que pode existir.

Eu sei que nem sempre conseguimos ser assim. No entanto, podemos ter um olhar poético de vez em quando, ou será que precisamos ser tão sisudos o tempo inteiro? Ser donos da razão e inquilinos do coração só nos garante a acumulação, e isso explica porque temos tanto e sorrimos tão pouco. Somos acumula(dores). Esquecemos de enxergar o óbvio, o qual pode estar em qualquer lugar, em qualquer coisa, em alguma pessoa, em uma simples conversa, ou no balançar das árvores quando a noite vem caindo de mansinho, bem devagar, e as brisas que a anunciam tocam em nosso corpo e dizem em nossos ouvidos baixinho quais estrelas iluminarão o céu. Você já enxergou o céu?

A saída da vida é a poesia, não há como viver sem enxergar beleza nesse mundo. Não há como transfigurar a realidade sem enxergar o despercebido, as entrelinhas, que, embora, óbvias, são invisíveis. Sei que a vida é cheia de dor e sofrimento, mas, se não considerarmos a sua imensidão de beleza e a sua capacidade poética, então, a vida está perdida, porque é para isso que vivemos. É na simplicidade que mora a poesia, a felicidade, o sonho, o sentido da vida. Mas, é preciso transvê-la para poder enxergar. Você possui imagin(ação) para isso?







Poderia dizer o que faço, onde moro; mas, sinceramente, acho clichê. Meus textos falam muito mais sobre mim. O que posso dizer é que sou um cara simples. Talvez até demais. Um sonhador? Com certeza. Mais que isso. Um caso perdido de poesia ou apenas um menestrel caminhando pelas ruas solitárias da vida.