Sociologia

Pandemia deve aumentar número de crianças e adolescentes órfãos

Hoje, já existem 47 mil crianças e adolescentes em situação de acolhimento no Brasil. Advogado especialista em direitos da infância e juventude acredita que com a pandemia esse número deve aumentar

Por: Júlia Pereira / Observatório do Terceiro Setor

Organizações de saúde e especialistas da área afirmam que a pandemia de Covid-19 tem maior impacto sobre os idosos, que já possuem um sistema imunológico fragilizado, assim como pessoas com doenças crônicas.

No entanto, é importante observar que os efeitos da doença podem ser sentidos por todos. Crianças e adolescentes, por exemplo, serão as principais vítimas de abandono e orfandade, já que a pandemia de Covid-19 atingirá seus familiares, cuidadores e responsáveis legais.

Essa é a preocupação de Ariel de Castro Alves, advogado especialista em direitos da infância e juventude. No artigo ‘País deve ter geração de órfãos da pandemia’, o advogado ressalta a importância do amparo dos menores de idade por outros parentes ou pessoas da comunidade com as quais elas já tenham vínculos afetivos, evitando, assim, que sejam encaminhadas para serviços de acolhimento.

“As Varas da Infância e da Juventude precisam estar preparadas para que esses casos sejam verificados, para que as equipes técnicas formadas por psicólogos e assistentes sociais identifiquem os parentes e familiares que possam ficar com a guarda da criança”, explica.

O mesmo acontece no caso de responsáveis legais pela criança ou adolescente que precisem de tratamento médico específico, como os pacientes com Covid-19. Em cenários como este, o ideal é que a criança ou adolescente fique, momentaneamente, sob responsabilidade temporária de outros familiares ou de pessoas com quem já tenha vínculo afetivo. Os serviços de acolhimento, segundo o advogado, devem ser acionados em último caso.

No início de abril, dados divulgados pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) revelaram que 34,6 mil crianças e adolescentes viviam em casas de acolhimento no Brasil.

Um mês depois, o índice já ultrapassou 47 mil crianças e adolescentes em situação de acolhimento. O advogado aponta possíveis razões para o crescimento rápido desse número: “indicativo de aumento da violência doméstica; surgimento de possíveis órfãos de vítimas da pandemia ou que o pai e mãe estejam internados; crianças e adolescentes que deixaram a situação de rua ou que deixaram suas casas em razão de negligência”, detalha.

Segundo Alves, por mais que os serviços de acolhimento sejam locais com alimentação e atividades culturais disponíveis, além de cuidadores e educadores preparados e qualificados, é necessário evitar que crianças e adolescentes sejam encaminhados para estes ambientes desconhecidos.

“Isso gera um trauma, um sofrimento muito grande, além daquele que a criança ou adolescente já vai estar passando diante do falecimento do pai, da mãe ou do seu cuidador”, diz.

Mesmo que o acolhimento seja realizado de forma imediata, os efeitos psicológicos da perda de um familiar próximo ainda poderão ser sentidos pelas crianças ou pelos adolescentes.

Em razão disso, é necessário que os órgãos públicos tenham à disposição serviços de acompanhamento psicológico, que ajudem o menor de idade a passar pelo momento de luto e superação.

“É fundamental que exista também esse apoio psicológico e a rede pública precisa estar preparada para essas situações. É necessário termos centros de referência especializados que possam garantir esse atendimento psicológico às crianças e adolescentes”, ressalta o advogado, que lembra também da Lei 13.935, promulgada no último ano, que institui a necessidade de atendimento psicológico e assistência social nas escolas da rede pública do país.

O serviço será ainda mais essencial no período pós-pandemia, no atendimento às crianças e adolescentes que possam estar lidando com algum trauma em razão do momento atual.

Falta de acolhimento coloca crianças em risco
A situação dos menores de idade que poderão se tornar órfãos durante a pandemia é diferente em cada classe social.

Crianças e adolescentes que moram em comunidades mais vulneráveis e que não forem acolhidos por parentes, pessoas com vínculos afetivos e até mesmo pelo Estado podem acabar se envolvendo com atos infracionais.

“Se a criança não tiver apoio de outras pessoas, de adultos que possam amparar, cuidar, educar, ela pode sim ficar em situação de risco, abandonada pelas ruas, em situação de exploração do trabalho infantil, em exploração sexual, ou envolvida em crime e violência, tanto cometendo quanto sendo vítima”, ressalta Ariel.

O trauma resultado da perda e do abandono também pode, segundo o advogado, levar crianças e adolescentes ao vício em drogas e álcool. “São todas essas situações que precisamos refletir nesse momento e nos preparar enquanto sociedade para acolher, amparar, cuidar dessas crianças e adolescentes que possam, por ventura, perder a sua principal referência: seus pais ou seus responsáveis”, diz.

Violência sexual também é um perigo

Além dos traumas gerados pela perda do responsável legal, os casos de violência sexual contra crianças e adolescentes também podem aumentar no período da pandemia.

No último ano, dados divulgados pelo Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) revelaram que quase 90% dos casos de violência sexual contra crianças e adolescentes são registrados no ambiente familiar.

Das 17.093 denúncias de violência sexual contra crianças e adolescentes recebidas pelo Disque 100 (conhecido como Disque Direitos Humanos) no ano de 2018, 13.418 se referiam a abuso, enquanto 3.675 eram casos de exploração sexual.

Por meio dos dados, o MMFDH observou que 70% dos casos de abuso têm como autor o pai, padrasto ou a mãe da criança.

Ariel de Castro Alves ressalta que, em geral, os casos de violência doméstica contra crianças e adolescentes são denunciados por professores e agentes de saúde, algo que, neste momento, não é possível de ser feito.

“Quando as aulas estão suspensas e as crianças têm menos contato com pessoas externas, a denúncia fica mais difícil de ser realizada. Por isso, é necessário termos redes comunitárias de proteção para que vizinhos e outros familiares possam prestar apoio”, diz.

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