Traduzido e adaptado de The Telegraph
Vem ai um novo filme sobre o surgimento do cristianismo, mas dessa vez a história é contada por outro ângulo, pelo visão de uma mulher. Trata-se de Maria Madalena que, sem
dúvida, é a figura mais enigmática e mais inspiradora depois do próprio Jesus. Nenhuma outra personagem bíblica inspirou tantos pintores, poetas e romancistas quanto ela.
Madalena, a prostituta, a libertina, a mulher cuja salvação se deveu a seu arrependimento.
O evangelho não afirma isso, mas os primeiros pais da Igreja juravam que sim. Quem foi a
prostituta que lavou os pés de Jesus? Ninguém sabe, nem esses tais senhores sabiam, mas deram a interpretação que melhor lhe convinham na ocasião: Madalena se encaixava direitinho no perfil, então decidiram que ela seria a mulher de vida fácil arrependida.
O mestre nazareno não carecia que se apagasse a figura de uma mulher para elevar a sua,
e é pouco provável que ele concordasse com tal artifício. Mas… e os outros homens? Para
a época, deixar que uma mulher se destacasse mais que qualquer homem, era uma heresia. A mulher tinha papel secundário, como foi por séculos e séculos até os dias atuais
em muitos países.
Vista como criaturas sexuais, era de bom tom deixá-las de fora do clero, portanto, colocá-las todas no mesmo balaio, se fazia necessário na visão deles. E o papa Gregório (540-604 d.C.), sabiamente declarou que Madalena simbolizava todas as outras chamadas Maria nas escrituras sagradas, exceto, claro, a Maria mãe de Jesus (mas essa Maria seria virgem, portanto não se comparava às outras)
Mesmo nos escritos escolhidos para compor o Novo Testamento, Madalena se destaca
como uma pessoa muito próxima a Jesus, que não o negou e tampouco o abandonou, se
mantendo firme aos pés da cruz. Era amiga da outra Maria, a mãe, o que faz-se crer que
fosse uma pessoa muito estimada pela família. Foi a primeira testemunha do ressuscitamento, portanto aparece nas escrituras como uma força muito importante se não a mais importante dentre os seguidores do Cristo.
Nos escritos apócrifos Madalena tem destaque muito mais substancial, superando nesse
aspecto qualquer um dos outros apóstolos, sendo inclusive apontada como autora de um
desses textos, chamado Envangelho de Maria. Os apócrifos foram banidos pelo clero, que
não via relevância.
Reduzir a figura de uma mulher como Maria Madalena não seria tarefa fácil, mas era
necessário, caso contrário o domínio seria das mulheres, ou, no mínimo, compartilhado de
igual para igual. O fato é que os primeiros cristãos começaram em um espirito proto feminista. As mulheres, vistas como iguais aos homens, foram estimuladas a deixar seus lares e famílias para ajudar a espalhar a palavra. Só que, ao passo em que a igreja foi se tornando mais patriarcal, as autoridades destituíram as mulheres de seus papéis públicos como diaconisas, pregadoras e professoras, e recomendado, em vez disso, a apresentação e o altruísmo exemplificado pela Virgem Maria, a mãe do Cristo.
A outra Maria
Virgem e mãe, Maria era um ideal impossível para as mulheres comuns copiarem. No entanto um ícone amado, ela ajudou a manter as mulheres firmemente em seu lugar doméstico subserviente. Opondo a imagem da virgem à da prostituta, a Igreja ensinou que o sexo era perigoso, porque levou, em última análise, à morte. Os corpos das mulheres eram assustadores. O poder das mulheres e a criatividade no amor, na concepção e no parto não podiam ser reconhecidos como sagrados. O batismo foi o nascimento “real”, prometendo a vida eterna.
Maria Madalena tornou-se para feministas modernas uma figura inspiradora, desafiando essas ideias misóginas e divisórias.
Cada século cria uma visão da Maria Madalena que precisa. Uma e outra vez ela sobe na imaginação dos artistas e agora é a vez dos cineastas.
O filme Maria Madalena estreia no Brasil no dia 15/03