Por: Juliana Santin

Tive oportunidade de participar de uma atividade de voluntariado graças ao meu irmão, que é coordenador de um projeto lindo em São Paulo e confesso que foi uma experiência transformadora.

Eu já vinha de uma crise existencial bem profunda justamente sobre a questão da falta de amor no mundo. Brincando um pouco com a famosa frase do filme O sexto sentido, poderia dizer que “vejo pessoas tristes”. Com que frequência? O tempo todo. O mundo está doente de amor. As pessoas têm cada vez mais pânico e depressão. Sofrem em silêncio, fingem alegria, acham que estão fazendo sucesso quando têm dinheiro e status, corpo perfeito ou fama, mas estão zanzando pelo mundo de cara amarrada, culpando a todos por tudo, estressados, obesos, tensos, com dores físicas e muitas, muitas dores da alma.

Do que as pessoas precisam, afinal? Estava vendo uma entrevista com o médico Patch Adams (aquele que fizeram filme, que se veste de palhaço para alegrar doentes em hospitais) e ele responde a essa minha pergunta: as pessoas precisam de comida e de amizade. Só isso. Após as necessidades básicas estarem satisfeitas, do que precisamos mesmo é de amor. De pessoas que nos enxerguem e que se interessem pela gente, que nos olhe nos olhos e que sorriem. Todo mundo anseia por afeto. Enviar mensagens de boa tarde para aqueles que gostamos de vez em quando pode ser uma demonstração de afeto.”

“As pessoas estão solitárias, questionando o sentido de sua vida (…), mas a medicina não encontrou uma pílula para a solidão”, diz ele.

Após crises muito profundas, que o levaram a tentar o suicídio ainda muito jovem, Patch Adams decidiu que se matar não era a solução. Assim, resolveu dedicar sua vida a fazer uma revolução: a revolução do amor. Ele diz que decidiu que seria “irritantemente feliz”, para que pudesse ser, ele mesmo, o próprio instrumento de sua revolução.

Assim, ao abrir uma clínica com atendimento de saúde gratuito nos Estados Unidos, ele atendia os pacientes de uma forma completa, criava uma relação com eles, fosse qual fosse sua doença. Ao começar a visitar as casas das pessoas, percebeu que menos de 3% da população tinha autoestima, menos de 5% tinha ideia do que era vitalidade no dia-a-dia.

“Os adultos normais não gostam de si mesmos, não gostam de seus casamentos e não gostam do seu trabalho”.

Patch Adams resolveu que ia criar um hospital onde imperassem as seis qualidades que ele considera fundamentais: feliz, engraçado, amoroso, cooperativo, criativo e pensador – que, no final das contas, resumem-se mesmo em amor.

“Mas percebi o quanto era difícil chegar perto das pessoas em um mundo muito suspeito com relação ao amor”. Assim, ele decidiu vestir-se de palhaço como uma forma de poder dar amor sem receber resistência das pessoas.

Patch Adams busca criar uma relação com as pessoas que ajuda, ou seja, uma troca. Não é um trabalho voluntário aleatório, uma coisa para cumprir tabela. É a vida dele, pois ele percebeu que o amor é uma via de mão dupla. É necessário que haja um caminho de ida e volta do amor. Ninguém consegue entrar na casa do outro mantendo suas portas fechadas.

Talvez se nos colocarmos em uma posição de superioridade de que estamos sendo bondosos e doando nosso tempo e recursos para pessoas menos favorecidas possamos sentir algum tipo de vaidade ou alívio de certa culpa por saber que tem tanta gente morrendo de fome enquanto a gente deita a cabeça no travesseiro à noite e dorme tranquilo. Mas as dores da alma continuam. Para as dores da alma, só há um remédio: amor.

Patch Adams descobriu isso e entendeu que doenças e morte fazem parte da vida, que o foco não deveria ser dado na doença, mas sim, na pessoa, e que a coisa mais importante que podemos oferecer aos outros é nos importar com eles. Porque a medicina tem muitas limitações, podendo ou não fornecer uma cura, mas existe uma pessoa “por trás” da doença e ela é quem deve ser o foco. O bem-estar em vida vale mais do que a cura.

Na atividade que participei com as crianças carentes, percebi que temos que nos abrir. No momento em que olhamos o outro nos olhos com nossos olhos abertos, sentimos empatia, sentimos o que o outro sente. E dói, pois não é fácil sentir o sofrimento alheio. O olhar de crianças com realidades tão diferentes da nossa nos conta muita coisa. Assim como o olhar de pacientes sentindo dores intensas.

Mas, ao mesmo tempo, é assim que acontece a conexão. E quando a criança também consegue se conectar com você, o amor vem e volta. A gente vai lá para doar e recebe tanto de volta, mas tanto, que sai de lá se questionando quem é que ajuda quem.

Recebi até massagem de uma menina tão cheia de amor para doar. Deu até vergonha de postar nas redes sociais promovendo o ato como bondade e boa vontade minha. Deu vontade de promover o ato dela, das crianças. Deu vontade de explicar a pergunta que fizeram ao Patch Adams sobre como ele consegue sentir-se feliz sempre. A resposta está na troca. Ele dá, mas ele recebe muito. Ele se relaciona, ele troca. Afeto é uma das poucas coisas que não se gasta e que você não perde absolutamente nada quando dá; ao contrário, se sua porta estiver aberta, você recebe – e muito – de volta.

Assim, esse texto é sobre o dia em que fui em uma escola pública de periferia receber massagem e participar do encontro de crianças carentes com adultos carentes. Somos todos carentes de amor.







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