Por: Erick Morais

No filme “O Fabuloso Destino de Amélie Poulain”, um dos meus filmes preferidos, em determinado momento é dito para Amélie, uma jovem sonhadora, a seguinte frase: “São tempos difíceis para os sonhadores”. Curiosamente o filme é francês, a mesma França em que gritaram por liberdade há muito tempo. O fato é que essa liberdade não foi alcançada e, assim, o mundo cheio de estatísticas e variáveis, números e contas, não é um lugar aconchegante para aqueles que são acostumados a sonhar.

Vinicius certa feita escreveu sobre a esperança que os poetas carregam e que essa luz é o que lhes permite incansavelmente tentar dobrar a realidade. Ser sonhador, antes de qualquer coisa, é ter essa luz dentro de si, é não conseguir se acomodar diante da indiferença, é não se adequar aos padrões impostos, é ter a loucura de acreditar ser possível mesmo quando todos dizem não ser, é ter a capacidade de enxergar além do óbvio e perceber nas pequenas coisas a verdadeira felicidade.

Nosso mundo, cheio de regras e condicionamentos, é um lugar em que os sonhos não encontram terra arada para que possam florescer, de modo que temos produzido uma geração cada vez mais triste, frustrada com suas escolhas profissionais, vivendo de maneira mecânica e robotizada. Desse jeito, temos levado vidas melodicamente tristes porque somos incapazes de diferenciar uma jiboia engolindo um elefante, de um chapéu. Tampouco, possuímos a sensibilidade para entender que somos formados pela “soma de pequenos e belos detalhes” e que são esses detalhes que nos tornam a pessoa que somos e nos confere beleza.

Podar os sonhos das pessoas, a fim de transformá-las em massa de manobra de uma sociedade sufocante, um decalque de um modelo-padrão, nem de longe é saudável, muito menos torna a vida um lugar melhor e mais bonito. Todos nós nascemos livres e, portanto, por mais que existam grades tentando nos prender, ainda possuímos o direito de sacudi-las e proporcionar um dos mais belos sons da vida – o som de almas querendo exercer o direito de voar.

Talvez seja difícil compreender indivíduos que carregam tanta paixão dentro de si, pessoas que não se contentem em ser apenas mais uma etapa de uma produção em série. Os sonhadores não se contentam com o mundo como ele é, porque isso é sempre a decisão mais cômoda. Sonhadores não se satisfazem apenas copiando o mundo, pois eles possuem magia e esta lhes permite a audácia de construir novos mundos.

A bem da verdade, não é fácil ser um sonhador em um mundo tão pragmático, onde as emoções são apresentadas no plano cartesiano, como se tudo que sentíssemos pudesse ser mensurado através de fórmulas matemáticas. Não é fácil porque toda vez que decidimos alçar vôos mais altos, tratam de cortar as nossas asas, já que quem caminha uma vez pelo céu, jamais vai se contentar com o interior de uma gaiola.

Lembrando Shakespeare:

“Enquanto houver um louco, um poeta e um amante, haverá sonho, amor e fantasia. E enquanto houver sonho, amor e fantasia, haverá esperança.”

Sendo assim, a vida precisa dos sonhadores, já que sem eles, a luz a que os poetas dão o nome de esperança desaparece e a vida torna-se um lugar gelado, cheio de neblina e extremamente escuro. A vida fica sem graça e nós… Ah, nós paramos de sentir e tudo se torna mecânico e desprezível, pois, como disse, quem um dia conhece o céu, jamais se acostuma com gaiolas. Nós tão somente fingimos que nos acostumamos, porque não temos coragem para ser o sonhador que habita o quarto dos fundos do nosso peito e, assim, esses tempos tornam-se difíceis para os sonhadores, que não querem nada além da liberdade de poder enxergar nas pequenas coisas as maiores felicidades da vida.







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